terça-feira, 24 de novembro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 232 - Por Luiz Domingues

Mais uma semana chegou e nós fomos de novo para a estrada, desta feita para outro quadrante do estado de São Paulo. Visitaríamos novamente Ribeirão Preto-SP, mas também a passar por Jaboticabal-SP e Indaiatuba-SP. Sobre a cidade de Ribeirão Preto, a nossa lembrança não fora boa, não pelo show em si que fizéramos, mas pela tragédia do dia seguinte, com a tempestade e o verdadeiro tsunami que devastou a cidade e nos causou muitos problemas. 

Desta vez nem cogitávamos que essa desgraça ocorresse novamente a atrapalhar os nossos planos, e a motivação foi outra, ao desejarmos um show animado e nenhum problema no decorrer da turnê. Mas na verdade, Ribeirão Preto foi o nosso segundo destino. Fomos primeiro para Jaboticabal, uma pequena cidade, localizada na mesma região.

Aprazível ao extremo, a cidade estava ensolarada quando ali chegamos e com o seu típico calor tórrido, porém logo nos refrescamos no hotel que ficava instalado em uma praça enorme e muito linda, muito bem cuidada e tipicamente interiorana, munida de um coreto, a estar super ajardinada e arborizada.
Entrada principal do Hotel Municipal de Jaboticabal, com a sua arquitetura vintista que nos encantou

Sobre o hotel cabe destaque também, por conta da sua arquitetura dos anos 1920, ao aparentar estar parado no tempo, de tão bonito e conservado que se apresentava. Marcello e Rodrigo filmaram-no amplamente, e um dia essas imagens de bastidores vão parar no You-Tube, assim espero.

A casa onde tocaríamos ficava no outro lado da praça, e era muito bonita, exatamente por ser um casarão daqueles típicos do interior, com pé direito muito alto, janelas imensas na fachada, com amplos cômodos. Ficara claro se tratar de um antiga residência de família, mas que naquela circunstância estava adaptada para ser uma casa noturna, embora o proprietário tenha sido feliz em preservar ao máximo a originalidade da construção. 

Durante a realização do almoço, eu senti que o arroz servido não assentou-me bem. Fiquei com dores estomacais no período da tarde, e abstive-me de supervisionar a montagem do equipamento, ao permanecer a descansar no hotel, para ver se conseguiria ao menos fazer o soundcheck. Daniel "Kid", o nosso roadie, ficou de prontidão para preparar o som do baixo, caso eu não conseguisse, e ele tinha habilidade para tal, por ser um bom baixista e guitarrista, também, já naquela época. 

Enquanto isso, o "seu" Walter e o Luiz Barata estavam percorrer a cidade para achar uma oficina mecânica, pois no decorrer da viagem, o nosso motorista já havia detectado problemas na embreagem do ônibus. Seria, segundo nos disse, uma peça relativamente barata para ser adquirida, mas motivaria necessariamente tirar o motor fora do chassi do carro, para fazer a troca e remontá-lo, ao se gastar horas, e com a certeza da roupa a se emporcalhar com a graxa.

Fim da tarde e vieram me chamar no hotel. O meu estômago havia se acalmado, mas ainda não estava 100%, todavia, eu pude ir à casa onde tocaríamos e realizei o soundcheck. 

Anoitecia e a temperatura ficou muito mais agradável. O dono do estabelecimento nos ofereceu um jantar muito agradável, servido na área externa da casa, onde antes houvera sido um amplo quintal residencial, certamente.  

O nosso amigo de São José do Rio Preto, Junior Muelas veio assistir o show e trouxe consigo alguns amigos, rapazes e moças a formar uma pequena comitiva de Rockers. A noite prometera.

O baixista Superb, Gabriel Costa, do "Homem com Asas" na ocasião, e hoje em dia (2015), a atuar com o Violeta de Outono 

A banda de abertura nessa noite seria o "Homem com Asas", outra banda amiga que já havia aberto os nossos shows pelo interior em outras ocasiões e eram nossos amigos de ideias e ideais. Foi muito bom e animador ter as personas de Gustavo "Gus", Gabriel Costa & Cia. conosco nessa noitada.

Quando voltamos ao hotel para o relaxamento final/banho, vimos que a praça estava com mais gente a circular, mas a frequência estava estranha, com muitos travestis "vestidas" de forma quase indecente, e um séquito de malandros, ao estilo da periferia das grandes cidades. Nessa altura, já estávamos convencidos de que o interior já estava contaminado por tais hordas urbanas, e isso não era mais exclusividade das grandes cidades, infelizmente.

Quando voltamos à casa, que se chamava, "Otello", vimos que o "Homem com Asas" já estava a tocar a todo vapor. Sobre a banda nada a comentar, a não ser o que já sabíamos: era ótima e se não tocavam músicas autorais normalmente, os covers que faziam eram para ouvidos privilegiados, pois os colegas escolhiam muitas músicas "lado B" de bandas clássicas, e até de bandas obscuras do Rock 1960 & 1970, fator de, e para experts, é óbvio.

A casa apresentava um ótimo público, com muitos freaks locais ali presentes, mas a seguir o padrão de casas noturnas interioranas, a maioria do público era formada por jovens bem-nascidos, financeiramente a falar, da sociedade local.  

O dono do estabelecimento era um sujeito dócil, mas mostrava-se contrariado com o volume com o qual o "Homem com Asas" estava tocar e nós percebemos que ele mandou insistentes recados para que o pessoal da banda diminuísse o seu ímpeto. A sua preocupação teve uma razão justa, visto que o casarão estava cercado por residências e certamente que seria muito improvável que a vizinhança fosse formada por admiradores de músicas do Led Zeppelin, Cactus e Budgie, entre outras pérolas, que estavam a ser executadas com maestria pelos componentes do "Homem com Asas".

Por outro lado, a clássica observação, não só para essa casa, mas para quase todas que se propõe a realizar shows de Rock, ou seja, o dono não quer investir um centavo na estrutura de isolamento e prefere atazanar os artistas com pedidos de volume inaceitáveis para a prática corriqueira do Rock'n' Roll. Isso é um fato.

Bem, já ficamos avisados que ele perturbar-nos-ia com tal reivindicação e no caso da Patrulha do Espaço, seria difícil conter a volúpia sonora tradicional da nossa banda. E foi o que ocorreu, embora eu deva salientar que o rapaz era educado e gentil e se nos pressionara, fora por estar a ser violentamente pressionado, também.

Lembro-me até de uma interrupção, quando nos foi informado que a Polícia Militar havia sido acionada por vizinhos, e logo após a execução da música: "Robot", tivemos que dar uma parada e só voltamos para concluir o show, após alguns minutos com um clima meio estranho por conta do nervosismo instaurado. Mas o concluímos, sim, e apesar dos pesares, não chegou a estragar a noite, pois a impressão causada fora a melhor possível, e no cômputo geral, nós apreciamos muito a reação calorosa da plateia.  

Aconteceu no dia 29 de novembro de 2002, no "Otello", de Jaboticabal, e com cerca de trezentos e cinquenta pessoas na plateia.

Voltamos para o hotel, satisfeitos com o show de Jaboticabal, e só houve um problema nesse momento: o "seu" Walter achara a peça que o ônibus necessitava, mas o conserto demorado ficara para a manhã seguinte. Ele e Luiz Barata se prontificaram a cuidar disso e os demais, incluso eu, pudemos descansar, enfim.

Por volta das duas da tarde, quando sinalizaram que estava tudo bem para partirmos, e por sorte, o trajeto entre Jaboticabal e Ribeirão Preto é mínimo. Nos despedimos do charmoso hotel vintista, com o sentimento bom do dever cumprido.

Continua...

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