sábado, 30 de maio de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 284 - Por Luiz Domingues


Quando chegamos ao local do show, constatamos que havia poucas pessoas no local, a despeito da noite bonita que fazia e apesar de fria. E a temperatura baixa não significou nenhuma desculpa, pois a pracinha próxima ao grande lago, esteve abarrotada de gente jovem, incluso vários Rockers, que supúnhamos, iriam para o show a seguir.  De fato, é tipicamente brasileiro deixar tudo para a última hora e em cidades interioranas de pequeno e médio porte, isso ganha a agravante de que todo mundo o faz deliberadamente, pelo fato das distâncias serem mínimas em cidades de tais dimensões. Mas a nossa esperança de que o público aumentasse pôs-se a diminuir na inversa proporção de que o tempo passava, e a faltar pouco para o horário de início do espetáculo, não houve indício de que a parca presença de público aumentaria.

E para piorar as coisas, o público presente foi formado em sua esmagadora maioria, por headbangers radicais, que muito provavelmente não tinham orientação alguma sobre o que era o trabalho d'A Chave do Sol. Nem mesmo o repertório do EP de 1985, que foi onde mais chegamos perto do Heavy-Metal oitentista, chegava minimamente próximo do metal extremo que esperariam...

Foi uma turma bastante agressiva, e antes do show começar, estavam a espantar o tédio a arrastar longas correntes no chão e a usá-las eventualmente como chicotes para dar chibatadas nas paredes, e assim a produzir um som horripilante, que faria Roger Corman os contratar imediatamente para trabalhar na sonoplastia de seus filmes de terror.

Ao consultarmos o nosso roadie, Eduardo Russomano, que era da cidade, fomos informados que aquela turminha era a dos hradbangers radicais e que costumavam ir em todos os shows de Rock produzidos na cidade, independente de ser orientados pelo Heavy-metal ou não. Foi bem compreensível,portanto, ao se tratar de uma cidade interiorana, diferente da capital onde havia shows para todas as tribos e tendências, simultaneamente.


No entanto, a pergunta a ser feita naquela noite, foi: Aonde estava o público Rocker com gosto mais moderado? Por que não chegavam se a cidade tinha essa tradição de conter um público significativo, e a nossa banda em específico, era, supostamente querida, ali? Pois tais perguntas jamais foram respondidas a contento, contudo, uma lição tivemos ali: o empreendedorismo sofre derrotas inexplicáveis, e no ramo da produção artística, muitas vezes fatos dessa monta acontecem.

Muitos fatores podem decretar o insucesso de um espetáculo, em linhas gerais: chuva; greves repentinas deflagradas por funcionários do transporte público, queda de energia elétrica, shows de grande apelo popular na mesma hora, último capítulo da novela na TV, final de um campeonato de futebol transmitida ao vivo na TV etc. Todavia, na ausência desses fatores, e a deixar claro que o preço cobrado no ingresso foi extremamente acessível, qual a explicação para o nosso fracasso nessa ocasião?

Bem, alheios ao resultado de bilheteria aquém de nossas expectativas, subimos ao palco e demos o nosso recado com o profissionalismo acima de nossa decepção. Tocamos o nosso repertório normal, e sinto muito se frustramos os apreciadores de Heavy-Metal extremo que ali se encontravam. Justiça seja feita, apesar de serem pessoas radicais e não muito preocupados em se portar com educação, não nos hostilizaram, a respeitar a nossa proposta muito "leve" para os seus padrões extremados em termos de gosto musical.

Sei que estou a insistir em um lamento sobre o fracasso de público desde que iniciei o capítulo, mas visto pela ótica atual, de 2014 (quando escrevi este trecho), o número de pagantes ali presentes não caracterizaria um fracasso propriamente dito. Digamos que esteve aquém do que esperávamos, sem dúvida, mas cento e vinte pagantes não configurou exatamente um fiasco...

Bem, o show ocorreu no dia 10 de maio de 1986, com os tais cento e vinte pagantes presentes na plateia.  

A seguir, faríamos um show no Rio de Janeiro, que reputo ter sido histórico para a banda. E a reforçar a máxima de que o "telefone estava a tocar", fomos contactados para conceder entrevista para uma nova revista que entraria no mercado, e teria peso editorial, sem dúvida. E nada teve a ver com o convite para fazer parte de um poster, editado por uma outra revista, da concorrência, fato ocorrido na mesma ocasião.

Programas de TV e rádio nos chamavam sem que os procurássemos, e a agenda de shows começara a aumentar, mesmo que ainda não tivéssemos um empresário eficiente para cuidar de nós, de maneira eficaz. Nessa metade de 1986, o "momentum" foi excepcional. Acho que muito provavelmente foi o nosso pico como exposição midiática e gerencial. Artisticamente não foi o melhor momento da banda ao meu ver, mas gerencialmente, acredito que sim. Dessa metade, até o final de 1986, acredito que foi o nosso auge como banda emergente, que quase chegou ao mainstream, e daqui para frente, eu vou relatar vários fatos que corroboram tal impressão que tiemos fortemente à época.

Continua...

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