segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 40 - Por Luiz Domingues


Foi quando eu percebi que a Verônica havia parado de cantar, por que eu a acertara violentamente com o headstock do baixo! Ela estava com a mão sobre o rosto e quando a tirou, a sua face estava muito marcada pela cor avermelhada, certamente devido ao hematoma gerado de forma instantânea. Mesmo assim, nós continuamos a tocar, e só depois do show eu pude pedir desculpas pelo acidente.

Tive os meus dias como Pete Townshend ali no Victoria, e como ele, também causei acidente pelos excessos cênicos, enfim!

Tirante esse acidente do qual ela foi vítima, o que estava a acontecer com a Verônica em relação à banda? Ela passou a denotar uma distância de nós, o que contrastara com a sua então docilidade e simplicidade com a qual nós havíamos nos habituado a lidar, desde que ela ingressara em nossa banda.

Dessa forma, passou a ser comum que ela não comparecesse aos nossos ensaios e nos shows, ela chegava em cima da hora para a apresentação, sem aguardar previamente conosco o momento da apresentação, quase toda noite. E assim que o espetáculo se encerrava, ela se despedia rapidamente de nós e partia, sem muita chance para conversarmos. 

Então descobrimos que ela na verdade estava a receber propostas  para se lançar como uma cantora solo e assim, ao encerrar o nosso contrato, que se desvinculasse da nossa banda mediante a promessa de um contrato com uma gravadora major, a garantir-lhe gravação de um disco, a formação de uma nova banda contratada para acompanhá-la, e ela a assumir-se como uma estrela isolada.

Sendo assim, quando acabou o contrato com o Victoria Pub, ela saiu sumariamente d'A Chave do Sol, e nós ficamos sem perspectivas imediatas, pois todo o embalo maravilhoso que havíamos adquirido desde outubro de 1982, esvaiu-se, por que estávamos sem outras datas em vista, e também por termos que procurar às pressas um novo vocalista ou voltarmos ao formato como Power-Trio e assim termos sido obrigados a reestruturar todo o repertório para o Rubens, ou o Zé Luiz cantarem. 

Isso sem contar o prejuízo de se perder uma vocalista do potencial sensacional que ela possuía. Se tivéssemos prosseguido com ela e com a sorte de arrumarmos um produtor, muito provavelmente o nosso futuro teria sido bem diferente. 

Com esse revés, nós experimentamos a primeira curva descendente na história da nossa banda. Relatarei a seguir essa fase dura que durou três meses, aproximadamente, sob uma profunda aspereza.

Essa foto foi clicada durante a realização de um soundcheck no Victoria Pub,  sem a presença da Verônica Luhr. Tornou-se irônica, pois com a sua súbita debandada obrigou-nos a voltarmos ao formato de um Power-Trio, doravante.

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 39 - Por Luiz Domingues

Zé Luiz Dinola, em um desses shows d'A Chave do Sol realizados no Victória Pub, em 1983

5) Sobre A Chave do Sol e o Victória Pub:

Na reunião em que fechamos o contrato, o diretor da casa advertiu-nos apenas sobre não exagerarmos no visual "Riponga" (palavras e preconceito, dele), além de não falarmos palavrões ao microfone (senti-me dentro do filme: "The Rose"... -"hey you, motherfuckers"...), e pediu-nos para tocarmos músicas conhecidas. Não houve restrição para que tocássemos músicas autorais mescladas, mas desde que não houvesse exagero nessa determinação. 

O pagamento ficou acordado para ser realizado semanalmente. O primeiro show, no dia 1° de fevereiro de 1983, foi realizado no palco pequeno, conforme já mencionei anteriormente. Mas logo no segundo dia, perceberam que a nossa banda jamais poderia tocar em um palco ao estilo "lounge" de piano bar, e sendo assim, escalaram-nos para o palco principal, a partir do segundo dia. Tocávamos várias músicas nossas, mas evitávamos as instrumentais muito longas, para privilegiar o talento vocal da Verônica Luhr, logicamente. 

Verônica e Rubens na linha de frente, Zé Luiz na retaguarda. A Chave do Sol no Victoria Pub de São Paulo em 1983!

A nossa performance era frenética. Eu, Luiz, Verônica, e Zé Luiz, principalmente, entrávamos a todo vapor. Eu exagerava mesmo, pois estava 100% seguro como músico, e permitia-me uma mise-en-scène frenética, sem prejuízo ao desempenho musical.

O Rubens sempre foi mais comedido, ao menos nessa época, pois depois se soltou e dessa forma, costumava tocar concentrado e estático. Mas para compensar, ele tinha os seus arroubos frenéticos e "Hendrixianos" ao tocar a guitarra virada atrás da cabeça, ou mesmo a tocar com os dentes, e claro que eram momentos em que ele despertava a intensa euforia da plateia, cujo clímax aguardávamos como se fôssemos mágicos ilusionistas, que sabem exatamente onde usar o seu melhor truque, no pico de seu show. 

A Verônica continuava a se apresentar de forma exuberante, inclusive nos trejeitos, com muito frenesi. No entanto, algo pior estava por acontecer em nossa relação. 

Antes porém que eu comece a narrar esse ponto de divergência, preciso mencionar que uma vez, eu cometi um acidente que poderia ter tido gravidade. Estávamos a executar a canção: "O Contrário de Nada é Nada", dos Mutantes, certa vez, quando na euforia da minha mise-en-scène, eu estabeleci um movimento muito brusco com o "headstock" do baixo (a chamada "cabeça", onde ficam as tarraxas que afinam o instrumento). Estava alucinado a tocar, e nem senti que dei um tranco em alguma pessoa.

Eu, Luiz Domingues, a viver os meus dias como uma espécie de "John Paul Jones da Pauliceia", com o meu Fender Jazz Bass a roncar forte, plugado em um amplificador, "Acoustic", cortesia do amigo, Nelson Brito.

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 38 - Por Luiz Domingues


4) Ainda a falar sobre os bastidores, lembro-me de uma específica noite, quando tivemos a sorte de tocar para animar uma festa organizada pela Rede Globo, que comemorava o encerramento de uma mini série, chamada: "Bandidos da Falange", que abordava o submundo do crime no Rio de Janeiro etc. e tal. 

Toda a equipe técnica, diretores e muitos atores esbaldaram-se ao som d'A Chave do Sol. Lembro-me de algumas personalidades tais como a Betty Faria, Roberto Bonfim, Gracindo Júnior, e Júlia Lemmertz, entre outros, a dançar enquanto tocávamos.

 
 
 

Eis acima, os atores e atrizes que eu citei no texto: Roberto Bonfim, Betty Faria, Julia Lemmertz e Gracindo Junior
 
Informações sobre a mini série "Bandidos da Falange":
http://pt.wikipedia.org/wiki/Bandidos_da_Falange

E também foram notórios os shows com artistas famosos que ocorreram ali. Naquela época, todo o pessoal do mundo do BR-Rock 80's que estava a explodir na mídia, apresentou-se ali com multidões a assisti-los, e muita badalação. Os shows com artistas grandes do mainstream, aconteciam às sextas e sábados. 

Nunca fomos assistir nenhum, mesmo por que, não nos interessávamos por aquela turma oitentista, com menção honrosa ao Barão Vermelho e ao Herva Doce, que não foram frutos oriundos da árvore punk, e mantinham as suas raízes no Rock e no Blues. 

E que fique bem claro, nessa primeira safra de artistas, o BR-Rock 80's fora predominantemente carioca (com exceção do Paralamas do Sucesso, mas estes estavam radicados no Rio, também). Paulistas e brasilienses começaram a ter espaço após 1984. 

E neste caso do Victoria Pub, nós tivemos um contato discreto com uma banda dessas, por mero acaso. Ocorreu em uma sexta-feira onde havíamos passado ali só para apanhar o nosso equipamento, que não fora possível remover na madrugada anterior, quando tocamos. 

Foi em uma tarde quente de sexta-feira, em que ali estávamos na porta do estabelecimento que vimos dois carros com placas do Rio de Janeiro, abarrotados com equipamentos e com elementos cabeludos em seu interior a chegar. 

Tratou-se da comitiva do grupo de Rock, Herva Doce, a aportar na Alameda Lorena em São Paulo. Foi engraçado ver os rapazes em uma situação não glamorosa, esbaforidos pelo efeito desgastante da viagem e a descarregarem o carro, eles mesmos, sem apoio da parte de roadies. Lembro de um dos carros ter sido uma "Belina" da Ford, anos setenta, abarrotada com coisas.

O guitarrista, Marcelo Sussekind, perguntou-nos a hora certa. Engraçado o destino, pois alguns anos depois, o Rubens em sua fase pós-Chave do Sol, e pós-Patrulha do Espaço, chegou a gravar um LP com uma banda que prometera estourar. Esse disco foi gravado no Rio de Janeiro, com toda a mordomia de gravadora major, e o Marcelo Sussekind seria o seu produtor... só a complementar, essa banda chamar-se-ia: "Yankee" e não lograria êxito por conta da morte trágica e repentina de seu vocalista, uma grande pena.

Particularmente eu tinha um respeito grande pelos músicos do Herva Doce, por conta da sua árvore genealógica boa. Seus membros foram oriundos do "The Bubbles" e por consequência direta, d'A Bolha, além de ramificações com Os Mutantes, Veludo Elétrico etc. Não eram da turminha do "Do It Yourself", pelo contrário, tinham história e estrada.

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 37 - Por Luiz Domingues

3) Sobre os bastidores:

Conforme eu já descrevi, o Victoria era uma casa labiríntica em sua arquitetura. A fachada não dava ideia do quanto era grande o estabelecimento, e com tantos emaranhados a conter ambientes diversos, câmaras secretas, saídas inusitadas para outros espaços etc. 

A decoração era riquíssima em detalhes e fora um luxo naquele começo de anos oitenta, já possuir um serviço de TV interna, com monitores em todos os ambientes e a exibir filmes sob orientação Sci-Fi, recém lançados por Hollywood tais como: "Tron" e "Blade Runner", por exemplo. 

O ambiente era muito burguês, mas apesar de ser dispare, não havia nenhuma hostilidade por parte do público formado predominantemente por garotos e garotas bem-nascidos e malcriados. Pelo contrário, mesmo não sendo Rockers, bastava qualquer uma das três bandas fixas começar a tocar, e eles dançavam, gritavam e aplaudiam. Na verdade, queriam mesmo divertirem-se a beber, drogarem-se e arrumarem parceiras sexuais, certamente. 

Muita gente do meio musical circulava ali. Lembro-me do Peninha Schimdt, Kid Vinil, e outras figuras. 

Uma certa vez, um sujeito cujo nome não recordo-me, nos cansou, eu e Rubens, por uns vinte longos minutos a falar de suas bravatas no meio da produção musical. Com cabelo cor de laranja e corte muito esquisito, bem ao gosto do modismo "New Wave", ele abordou-nos ao dizer ser produtor musical. 

Queria que o procurássemos no decorrer da semana em seu escritório, para que entregássemos o nosso material, pois (supostamente), dizia que esteve envolvido na produção dos shows do Van Halen, que viera recentemente ao Brasil, e aventava a possibilidade em colocar-nos para "abrir" show o Kiss, que segundo ele, viria em junho. Então, ele nos forneceu várias palhetas customizadas do Van Halen e o seu cartão. Não era um empresário, propriamente dito, devia ser um subalterno, mas ficava a circular pela noite a botar banca de. 

Esse impetuoso rapaz somente fez uma observação como ressalva: teríamos que cortar os cabelos à New Wave, e repaginar o figurino. Ao pensar bem, ele não estava errado. Éramos anacrônicos em 1983, principalmente eu e o Rubens, com visual de Rockers setentistas. 

O rapaz falou em cada um de nós adotar o cabelo de uma cor diferente, e usar aquele visual de Duran Duran. Ora, se fosse algo realmente concreto de sua parte, ao menos, poderíamos até cogitar a hipótese, mas daí a sair por aí e a modernizar-se à toa, a contragosto e sem uma perspectiva real, seria uma estupidez, principalmente pelo fato do principal quesito ser incompatível com esse visual trôpego: teríamos que mudar o som também!

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 36 - Por Luiz Domingues

2) Entre o pessoal do Tutti-Frutti, o convívio foi muito bom com o Luiz Sérgio Carlini. Logo o líder da banda, mostrou-se o mais receptivo, juntamente com o segundo guitarrista, Ronaldo Paschoa.
O baixista era Renato Figueiredo, e o baterista era o Marinho Thomaz, ex-Casa das Máquinas, e já no vocal, um outro ex-Casa das Máquinas, Simbas, que foram mais reservados conosco. 

A banda soava muito boa ao vivo, com o Simbas a cantar muito, e cumprir as vezes de um frontman/entertainer, com a desenvoltura dos velhos tempos. Infelizmente, eles mesclavam muitos covers, talvez sob uma proporção 70%/30 %, aproximadamente. 

Mas eu devo reconhecer que algumas interpretações dessas releituras, eram brilhantes. O solo em duo que Carlini e Paschoa faziam em "Hotel California", dos Eagles, foi memorável em todas as noites em que os vi a tocar tal canção. 

Lembro-me em ter conversado com o Carlini pela primeira vez em uma dessas tardes, no boteco ao lado do Victoria Pub. Fiquei muito contente em poder conversar com ele, e verificar que ele era extremamente humilde e acessível, sem nenhum estrelismo por conta da sua fama pregressa, desde os anos setenta. 

Recordo-me também de em um outro dia, onde ele mostrou ao Rubens o seu novo amplificador, uma espécie de coqueluche do momento, e tipicamente oitentista, a se tratar daquele cubo da marca "Roland", cor de laranja. Parecia uma caixa de sapatos. 

Alguns dias depois, o Rubens comprou um combo da marca Music Man e o Carlini apreciou muito o som, que ultrapassava o Roland e muito. 

Em uma outra ocasião, um outro membro do Tutti-Frutti chegou em uma tarde ao Victoria Pub, e sem ninguém para ajudá-lo a descarregar uma bateria de seu carro. Eu e o Zé Luiz fomos ajudá-lo prontamente, mas diferente do Carlini e do Paschoa, esse componente mantinha normalmente aquele distanciamento, do gênero: "eu famoso, vocês desconhecidos". O Zé Luiz aborreceu-se bastante com tal postura altiva, mas eu relevei, e não senti-me incomodado. Em um outro dia o Zé deu o troco, diretamente em tal rapaz, ao gerar uma situação desagradável que prefiro não revelar, mas foi um impasse desagradável.

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 35 - Por Luiz Domingues

E dessa forma, eu fui apresentado a Nelson Brito e Paulo Zinner, que a seguir, apresentaram-me ao Raul Müller. Instantaneamente estreitamos amizade pela proximidade de ideais, e logo de imediato, fui ajudado gentilmente pelo Nelson, conforme já revelei em capítulo anterior. 

Isso por que eu estava sem amplificador nessa época, e a casa fornecia equipamento de palco (backline), mas por alguma circunstância excepcional, esse trato foi rompido, e assim, vimo-nos na situação em não ter equipamento disponível, mais. Todavia, o Nelson prontamente ofereceu o seu amplificador e caixa, de marca Acoustic, um equipamento que sempre fora um sonho de consumo meu, pois o fato foi que eu cresci a ver fotos e vídeos de muitos ídolos internacionais, a usá-los. John Paul Jones, Gary Thain, Tim Bogert, John Deacon e tantos outros mestres das quatro cordas, por exemplo. 

E de fato, tratava-se de um amplificador maravilhoso, pois oferecia muitas possibilidades em termos de equalização, a trazer muito brilho, e um peso de arrasa-quarteirão. O meu Fender Jazz Bass roncou forte nesses quatorze shows que ali cumprimos!

E o Fickle Pickle, apesar de não tocar músicas autorais, era uma banda impressionante ao vivo. Tocavam canções do The Rolling Stones, The Beatles e The Who, principalmente, mas com uma volúpia tal, que pareciam estar a atuar no Marquee Club de Londres, nos anos 1960. Eu apreciava muito a performance deles.

2) Uma outra curiosidade, foi que um dos dirigentes do Victoria Pub, mantinha muitos contatos no meio fonográfico, e dessa forma, ele propôs aos instrumentistas do Fickle Pickle, que estes formassem uma banda paralela, onde ele mesmo seria o vocalista.

Dessa forma, a aproveitar-se do "Boom" do Br-Rock 80's que estava a florescer naquela época, Paulo, Nelson, e Raul gravaram e lançaram com esse sujeito, um single. A banda detinha uma estética enviesada pelo modismo da "New Wave"em voga, ao seguir os ventos oriundos do Pós-Punk, e recebeu o ridículo nome de: Pepino Irritadiço"... 
Os amigos não gostavam disso, mas claro que aceitaram e gravaram, pois foi uma oportunidade e nesses termos, não podiam mesmo dar-se ao luxo de recusar... 
A banda continha ainda duas "vocalistas", e na verdade, era uma espécie de "Trio Los Angeles" do Pseudo-Rock New Wave... o som que produziam, era realmente uma pasmaceira Pop, e que perdoem-me pelo termo forte, e pela sinceridade. Entre nós, o Zé Luis Dinola apelidou a banda como: "Cenoura Raivosa". 
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domingo, 29 de dezembro de 2013

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 34 - Por Luiz Domingues

Como eu tenho vários fatos a contar sobre esses shows no Victoria Pub, mas sem relacionar ao dia específico de cada ocorrência, falarei sem essa preocupação cronológica. Que fique subentendido que aconteceram durante esses quatorze shows que fizemos ali, entre 1°de fevereiro e 6 de abril de 1983.

1) Primeiro foi o convívio com o pessoal do Fickle Pickle. Logo que entramos no Victória Pub, a primeira pessoa que reconheci, foi o Catalau. Eu o conhecera em 1980, por ele ser amigo dos membros do Terra no Asfalto, minha ex-banda cover, e amigo de vários amigos em comum daquela turma de freaks que habitavam o bairro das Perdizes, na zona oeste de São Paulo.

A famosa pensão "São Geraldo", no bairro das Perdizes, local em que Geraldo "Gereba" e Wilson Canalonga Junior moravam, e onde muitas reuniões do Terra no Asfalto aconteceram...

Lembro-me em tê-lo conhecido em uma tarde no quarto de pensão onde Wilson e Gereba dividiam como moradia na Travessa São Geraldo. Ele estava lá com uma guitarra Fender Telecaster em mãos e foi naquela fase onde já sabíamos que o guitarrista, Fernando "Mu", sairia da banda. 

Chegou-se a cogitar a entrada dele na banda, para tal banda ficar então estabelecida mediante uma formação com três guitarras. Mas isso não avançou, e ele culminou em não entrar. Alguns meses depois, eu e Paulo Eugênio fomos visitá-lo em seu apartamento da Rua Ministro Godoy, nas Perdizes. Foi uma fase de reformulação da banda, mas que não deu certo novamente, pois o Aru Júnior estava a voltar dos Estados Unidos e assumiria a vaga deixada pelo Gereba, que mais uma vez esteve a viajar para o Nordeste. Mas isso eu revelo no capítulo do Terra no Asfalto, detalhadamente e no momento oportuno da cronologia. 

Nessa visita, o Catalau recebeu-nos, e ficou a estabelecer exercícios exóticos vocais e faciais que acabara de aprender, por ter lido o livro de um guru indiano. Foi hilário, mas ao mesmo tempo, o meu lado hippie vibrou com essa loucura que parecia perdida no tempo, em contraste com a fase dura em que estávamos a ingressar.

E tal ocorrido se deu no dia 18 de setembro de 1980. Por que eu gravei essa data? Simplesmente porque fora o aniversário de dez anos da morte do guitarrista norte-americano, Jimi Hendrix, e fora exibido um especial na TV sobre o Jimi Hendrix, no instante em que estávamos ali. 

Por isso, fiquei contente em encontrar o Catalau, ali em fevereiro de 1983, e verificar que a banda dele , o Fickle Pickle estava bem, a tocar de uma forma fixa em um lugar badalado da noite paulistana.

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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 33 - Por Luiz Domingues

Foto promocional do Harppia no início dos anos oitenta, com Hélcio Aguirra na formação da banda. Ele é o segundo da esquerda para a direita.

Conheci o Hélcio quando ele tocava no grupo Heavy-Metal, Harppia. Lembro em vê-lo ao vivo em um evento ao ar livre, a tocar com essa banda, chamado: "Praça do Rock", realizado na concha acústica do Parque da Aclimação, onde A Chave do Sol tocaria também algumas vezes, futuramente. Sobre nós tocarmos ali, só aconteceria em 1984. 

Mas sobre o Helcio, apenas nos tornamos amigos de fato, alguns meses depois dessa apresentação, quando encontramo-nos em um show no Teatro Lira Paulistana (não lembro-me ao certo, mas acho que foi um show duplo, com apresentações das bandas: Korzus e Sabotage), e nessa ocasião, voltamos juntos no mesmo ônibus que servia-nos em comum. 

Para falar do público do Victoria Pub, a sua reação costumava ser boa, no sentido de que dançavam e aplaudiam os shows, mas na prática, não fora um público genuinamente Rocker. Se tratava de jovens burgueses em sua maioria, e a verdade é que não estavam nem aí para ninguém, nem mesmo para o Tutti-Frutti, supostamente com muito maior fama. Aliás, o Tutti-Frutti tocava mais covers do que suas músicas autorais naquelas apresentações. Para nós, era ótimo estar ali pela badalação toda, a oportunidade de se conhecer pessoas do mundo empresarial e fonográfico, artistas famosos etc. Aliás, logo mais eu farei um relato de curiosidades sobre esses shows.
Contudo, a euforia no sentido de deslumbramento, acredito que não houve de nossa parte. Estávamos felizes e confiantes. Creio no entanto que a nossa espetacular vocalista passou por um momento de tentação, infelizmente, conforme relatarei logo mais, e decorrente dessa instabilidade dela, precipitou-se a sua saída da banda, de uma forma inesperada por nós, porém, em termos, conforme esclarecerei.
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Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 32 - Por Luiz Domingues

Nessa época em que conheci o Fickle Pickle, eles haviam abandonado a verve autoral quase por completo. Tocavam nessa fase da sua carreira, 99 % de covers, e a base era movida por sons dos Rolling  Stones, The Beatles e The Who, predominantemente. Anos depois, a banda voltou em paralelo ao Golpe de Estado e chegou a lançar disco autoral, com o André Christovam de volta à guitarra. 

O Catalau era o vocalista da banda, e eu já o conhecia desde 1980, pois ele era amigo do pessoal do Terra no Asfalto, banda cover em que toquei naquela época. 

Sim, essa formação do Fickle Pickle, foi sem dúvida o pré-"Golpe de Estado" ali já anunciado. Representara 3/4 do Golpe de Estado, que só nasceria oficialmente , contudo, ao final de 1985. Nessa época eles nem conheciam o Hélcio Aguirra. Eu conheci o Hélcio antes deles, em 1984, só para você, leitor, ter uma ideia. 

Tocar no palco principal do Victoria Pub, era sensacional, pois a estrutura era muito boa, e o ambiente lembrava o de um cabaré europeu dos anos 1920. E havia a questão do status quo, pois era ali que efetivamente chamava-se a atenção, visto que no palco secundário, o ambiente era mais ao estilo "lounge", para tocar bem baixo, e passar despercebido. E verdade... quase todos os álbuns do Golpe de Estado tem agradecimento à minha pessoa.
De fato, eu já ajudei o Golpe de Estado em muitas ocasiões, mas os seus componentes (mesmo antes de existir como banda, propriamente dita), que começaram a ajudar-me nessa época do Victória Pub. O fato é que eu estava sem um amplificador nessa época, e usei o equipamento do Nelson nessas apresentações no Victoria. O Nelson mal havia me conhecido e disponibilizou o seu equipamento, em uma gentileza que selou a nossa amizade, de forma instantânea. Fora o prazer de tocar com um amplificador que era o meu sonho de consumo, e a última foto deste capítulo, explica o por que disso...
Nunca esqueci-me dessa ajuda, e dali em diante, o ajudei sempre que pude, sob uma retribuição eterna.
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sábado, 28 de dezembro de 2013

Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 4 - Por Luiz Domingues

Eu diria que logo no primeiro instante, tratávamos essa diversidade como o nosso maior trunfo. O fato de ser uma banda aberta a várias sonoridades, deu-nos muita esperança em alcançar o mainstream, pois o nosso espectro artístico estava aberto a um público muito mais abrangente do que nossas bandas pregressas mais recentes (Patrulha do Espaço e Big Balls, só para citar duas), essas sim, fechadas em um nicho restrito do Rock underground. No início, almejávamos agregar os fãs menos radicais de nossas bandas de Rock mais recentes, mas poder atingir também fãs do Jota Quest; Skank; Nando Reis, e parcelas de público jovem adulto, seguidores de MPB então "moderna" (Lenine; Zeca Baleiro, Marisa Monte etc), e até o nicho da Black Music.

Com o passar do tempo, essa extrema abertura estrangulou-nos ironicamente sob um outro sentido, eu diria, não artístico, nem midiático, mas no setor empresarial, pois sem conseguir alavancar voos mais altos, os espaços no underground mostraram-se mínimos para a nossa sonoridade. Esse fator foi decisivo para sufocar a banda e matá-la por inanição em um momento futuro, mas uma volta seguir-se-ia mais para a frente (muito longe para falar disso ainda...). Todavia, acredito que no decorrer da narrativa, isso ficará ainda mais claro. Nesses primeiros ensaios o clima mostrava-se com muita camaradagem e descontração. Foi um bálsamo estar em um ambiente de trabalho leve.

Convencionou-se que os ensaios dessa nova banda seriam as segundas, por que três de seus cinco membros, atuavam em trabalhos musicais paralelos ou como side-man de artistas da MPB, caso do guitarrista Tadeu Dias, com Simoninha, ou bandas cover na noite, caso de Alex Soares e Marcelo "Mancha". Eu já era bem experiente na época, e sabia que isso era um problema e uma verdadeira bomba relógio ativada para explodir na frente, mas levantar essa questão ali seria causar um tumulto desnecessário, visto que todos os que tinham esses impedimentos sentir-se-iam incomodados, e negariam que essa vida dupla poderia refletir negativamente no destino da banda autoral que estávamos a criar.

Além do mais, eu fui o último a chegar e para ir além, não tenho essa característica de fazer cobranças, quem conhece-me, sabe que sou flexível e paciente. As primeiras músicas que praticamente já estavam prontas, fecharam-se com a minha entrada, e a definição de linhas de baixo. Os arranjos foram definidos e logo a seguir, mostrei uma ideia de balada que eu tinha, e deveria ter sido aproveitada pela Patrulha do Espaço, mas não aconteceu naquele trabalho. O Xando desenvolveu-a, criou letra e nasceu assim: "Amanhã de Sonho".

O baterista, Alex Soares, em foto de Grace Lagôa, no final de 2004

Poxa... era uma balada Pop, com condições de tocar no rádio, ser trilha de novela, mas ao mesmo tempo de um nível acima de qualquer suspeita, para provar a nós mesmos, que poderíamos trilhar um caminho interessante, ao almejar voos maiores, sem ter que apelar. No entanto, o clima ameno dos primeiros ensaios ficou um pouco tenso quando o Xando ligou-me após um ensaio para expor uma situação que estava por incomodá-lo, em relação ao vocalista, Marcelo "Mancha". Essa situação não era pessoal, tampouco técnica, mas de ordem artística, no tocante à identidade dele para com o trabalho. Após expor os seus motivos, entendi e concordei com a argumentação.



Continua...